Alinhando o mercado
O Projeto Carne Legal vem sendo desenvolvido desde o ano 2009, antes mesmo da aprovação do novo Código Florestal. Tudo iniciou com uma ação coordenada do Ministério Público Federal (MPF) para que os frigoríficos passassem a fazer compras com informações sobre área desmatada. Desde então, são diversos os critérios que os frigoríficos são obrigados a verificar. Questões como desmatamento ilegal, trabalho escravo, conflito agrário, enfim.
Mas, apesar de não ser uma novidade, nem todos os frigoríficos ingressaram no projeto. Como a participação demanda a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o MPF, ninguém gosta muito de fazer isso, porque significa quase uma confissão de que havia algo errado que vai passar a fazer da forma correta. É assim, porém, que são feitos os acordos.
O maior problema desse modelo é engajar os frigoríficos que não fazem parte do Carne Legal. Nesse sentido, o procurador da República do Ministério Público Federal de Mato Grosso, Erich Masson, criou uma estratégia para atrair os frigoríficos do Estado que ainda não assinaram o TAC da Carne Legal e colaborar para colocar o mercado em condições de igualdade, com objetivo de reduzir o desmatamento ilegal. Em entrevista ao Programa Boi na Linha, ele explica o trabalho que vem sendo realizado.
Boi na linha: O que o Ministério Público Federal está realizando em Mato Grosso para engajar os frigoríficos que estão fora do TAC da Carne Legal?
Erich Masson: Fizemos uma análise de quais são os frigoríficos que operam no Estado e que estão dentro do sistema de inspeção federal e inspeção estadual, com apoio do Programa Boi na Linha. Cerca de dez estão fora do TAC da Carne Legal. Em número absoluto, parece ser bastante, mas em termos de abate no Estado não é tão significativo. Um deles é uma unidade do frigorífico Minerva, que não é signatário aqui no Estado, mas assinou o Compromisso do Greenpeace. Então, mesmo que não sejam signatários do TAC nessa unidade em Mato Grosso, também cumprem os mesmos requisitos e nos encaminham relatórios.
Boi na linha: Quantos são os signatários?
Erich Masson: Vinte e dois frigoríficos em Mato Grosso, que representam mais de 90% do abate bovino, de acordo com o último levantamento feito em 2019. Seria necessária uma nova avaliação, porque com a pandemia tiveram frigoríficos que fecharam e outros que abriram. A procura por carne cresceu porque o preço aumentou muito nesses últimos tempos.
Boi na linha: Todos os frigoríficos estão no bioma Amazônia?
Erich Masson: Aproximadamente metade de Mato Grosso não é amazônico, assim, muitos frigoríficos são cidades maiores, como Cuiabá e Rondonópolis, que estão dentro do Cerrado, e outros também no Pantanal. Como temos Prodes Cerrado, que mede o desmatamento também nesse bioma, consideramos o Estado como um todo. Não importa se é o Prodes Amazônia ou Cerrado, as análises devem ser feitas nas propriedades dos fornecedores. Se hoje temos tecnologia, vamos utilizar. Além disso, o fornecedor de um frigorífico que está localizado no Cerrado pode comprar gado de um produtor na Amazônia. A ideia é que todos eles se engajem.
Boi na linha: Como é o engajamento?
Erich Masson: Encaminhamos ofício para todos os frigoríficos. Desses, apenas quatro participaram da reunião que realizamos em junho. Desses, três se interessaram em continuar as negociações. Enviamos o modelo do TAC, já atualizado com o Protocolo Unificado criado também junto com o Imaflora, no ano passado. Por enquanto, estamos em negociações com esses frigoríficos. Ainda não assinamos nenhum TAC novo.
Boi na linha: Qual é a principal dificuldade?
Erich Masson: Muitas vezes o frigorífico não sabe o que é o TAC. “É uma coisa aqui que vai complicar a minha vida”, pensam. A ideia foi mostrar que não é mais difícil fazer as análises como era antigamente nem tão cara. Outro ponto a explicar é o contexto do TAC. Em geral, ele é assinado quando há irregularidades. Mas ninguém investigou ou apontou nenhuma irregularidade daquele frigorífico, o TAC é justamente para evitar que isso aconteça.
Boi na linha: Como é a ação do Ministério Público Federal?
Erich Masson: Inicialmente de forma preventiva, como para solucionar problemas extrajudicialmente. Mas, se não for possível, a ideia é analisar as compras dos frigoríficos. Em um segundo momento, solicitamos todos os dados de movimentação de gado daquele frigorífico e para saber se há irregularidade ambiental dos fornecedores de gado. Se verificarmos que algum pecuarista tem fazenda com desmatamento ilegal, por exemplo, vamos embargar. Há um artigo no decreto que regulamenta o Código Florestal que indica a multa para fazendas que fornecem gado de áreas desmatadas. Cobramos a multa do frigorífico judicialmente e entramos com uma ação civil pública depois de feita essa análise em desfavor do frigorífico.
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